5 de fevereiro de 2011

Confiabilidade, Jazz e Whisky ...


O café se encontrava morno, ele gostava assim, quente e frio sempre lhe soaram como necessidades daqueles que buscam emoções inconsequentemente. Para ele o morno, o meio termo estava de ótimo tamanho. Sean não concordava, ambos se davam muito bem, amigos de tempos, mas Sean era intenso, quase maluco, só vivia pelas emoções. E apesar de tudo, de todo esse antagonismo quase insuportável entre os dois, eram bons amigos. Trocavam poucas palavras, mas geralmente era o necessário para que um entendesse as motivações e necessidades do outro.

Dessa vez não era diferente, James e Sean, ambos tomando café, James mantinha o seu morno e com uma quantidade considerável de açúcar, Sean gostava do seu puro, forte e quente. Entre uma bebericada e outra Sean puxa um cigarro, acende com seu isqueiro da sorte já bastante desgastado e comenta:

- Acho que vou deixar a Gretta, aquela garota já me deu nos nervos.
- Mesmo?
- É, ela nem gosta de um bom blues. Diabos, como eu vou confiar em alguém que não gosta de um bom blues?
- Verdade.

James voltava-se de tempos em tempos para o seu caderninho de anotações e escrevia alguma coisa, ZZ Top tocava e ele sentia que era um bom lugar para ter um pouco de inspiração, principalmente com os comentários eventuais de Sean.

- E a Suzie como vai? - Pergunta Sean
- Deve ir bem, desisti dela.
- Seu fracote, velho, chato.
- Verdade.
- Ao menos rendeu alguma inspiração?
- Nada, sabe que não escrevo sobre amor e essas coisas.
- Diabos, isso é impossível. - Sean da uma batida no balcão do bar.
- Verdade também.
- Ce tá mentindo demais pra si ultimamente.
- Talvez.

Nesse momento entra no bar uma mulher, bastante bonita, cabelos crespos quase na altura da cintura, olhos escuros e profundos, um narizinho pequeno e delicado e um sorriso com o canto da boca. Sean cutuca James, o segundo levanta os olhos rapidamente e os volta novamente para seu caderno. A mulher se senta há apenas dois bancos de distância deles e pede um martini com vodka. Sean vira para ela e com aquele vozeirão inconfundível fala:

- Hey, por que diabos as mulheres nunca pedem um scotch? Não entendo esses drinks.

A mulher somente ri para si mesma.

- Por que grande parte das mulheres são mais sensíveis que um barbudo com chapéu de cowboy, Sean - James responde sem levantar os olhos do caderninho. E continua:
- Elas gostam de apreciar mais o sabor do que a sesação causada pela bebida. Não que uma dama não possa apreciar um belo whisky é claro.
- Seu amigo tem razão.
- Diabos, é claro que tem, o Jamie sempre tem razão. Se existe uma verdade no mundo é essa. Mas antes de mais nada Sean Pollok, e esse "bonitão" do meu lado é Jamie Kindel.
A mulher da aquele sorriso com o canto da boca e diz:

- Evelyn, Evelyn Weiss
- Sabe, Evelyn, o Jamie aqui é escritor. É dos bons, daqueles que brincam com as palavras e ganham pouco dinheiro por isso.
- É mesmo, e será que eu já li alguma coisa dele?
- Se leu já deve ter esquecido, provavelmente deve ter pensado que não valia a pena. - Falou James enquanto fazia uma anotação.
- Nossa, ele é sempre seco assim? - Perguntou Evelyn.
- Geralmente, é um chato de galochas mesmo, um chato incrívelmente gente boa.

Os minutos se passaram com alguma conversa entre Evelyn e Sean, e ela novamente se dirige a James:

- Hey, além de chato é quieto?
- É bom, se ficar quieto vou ser menos chato não concorda?
- Faz sentido.
- Segundo o Sean eu sempre faço.
- Diabos, faz sim. - Vibrou Sean.
- E por que então não compartilha essa sabedoria conosco? - Nesse momento Evelyn já se encontra sentada na cadeira adjacente a Sean, e tenta dar uma olhada no caderninho de James.
- Não considero o que escrevo sabedoria. São só divagações, situações corriqueiras. Em geral procuro não rotular, e muito menos classificar de forma extrema.
- Morno - Diz ela.
- Tedioso - Diz Sean.
- É - Responde James. - Mas se quiser mesmo ler alguma coisa aqui está o que anotei por enquanto.

James passa seu caderninho para Evelyn, ela começa a folear devagar e vai lendo as poucas poesias e frases soltas que se encontram ali.

- Gostei do que vi, James. É bastante cru, gostaria de um dia ler algo seu finalizado.
- As vezes eu nem finalizo.
- Gosta de improvisar?
- Dizem que o jazz bom nasce assim.
- Eu prefiro o blues - reponde Evelyn.
- O que eu dizia, Jamie meu velho. Ela deve ser confiável.
- Com certeza eu sou, Sean. Gostei de conversar com você, vou te deixar meu telefone - Evelyn pega um pedaço de papel e anota o telefone nele, por fim passa para Sean.
- Ligo certo.
- Tenho que ir agora, até outra hora, rapazes.
- Até mais minha querida - Diz Sean.
- Até. - Diz James.
- Jamie, tá na hora de ser menos morno meu velho, esse telefone deveria ser seu. - Sean atira o papel em cima do balcão e James da uma sonora gargalhada.
- Por que a risada?
James aponta para um número ao lado da registradora do bar - Porque esse telefone é o do bar. O verdadeiro ela escreveu aqui atrás da capa do meu caderninho. Aposto que a Gretta nesse momento parece bem mais confiável do que antes não?
- Diabos, Jamie! Diabos mesmo! Garçom, traz dois whiskeys e por favor coloca um blues aí.

3 comentários:

jandora disse...

adorei, espero que não acabem!!! porque me gusta mucho ler.

Carolina disse...

Adorei, quando eu crescer quero ser a Evelyn ;)

Karen disse...

Cenário: Balcão do pub vazio.
E como eu disse: final genial!